Recentemente passei a ir em uma especialista em lutos. Essa especialista veio por indicação de uma amiga que teve um ótimo atendimento, foi preciso apenas uma consulta. Eu, pelo visto, vou demandar mais tempo. Pelo que entendi já finalizei o que tinha que finalizar e o trabalho para lidar com meus fins será longo, não foi colocado um tempo de tratamento, isso eu já não sei quando irá acabar. Eu já não tive um ótimo atendimento não, apesar de ter saído satisfeita com o sofrimento e em saber o que iria enfrentar, tive um atendimento necessário. Aquilo me atendeu.
Na primeira consulta saí de lá sem saber o que me ocorreu, algo me atravessou, fui em uma especialista em lutos, mas não foi por isso que contratei esse serviço, mesmo ter sido este justamente o motivo. Cheguei em casa pensando: há muito o que lamentar. E eu não sou muito fã desse movimento.
Em casa vejo formigas, há muito tempo, muitas formigas. Elas estão por todos os lados, das pequeninas que geralmente ficam no açucareiro, mas pela casa inteira. Vagueiam pela minha mesa, mesmo que eu limpe muitas vezes, será que tem algum doce nela que eu não consigo retirar? Pelos cantos das paredes elas também estão passeando, vi outro dia uma bem grande, parecia mãe de todas. Essa eu matei e não apareceu mais. Mas as pequeninas eu não tenho matado, deixo elas existirem na casa, mesmo tendo um produto para impedi-las. Psicanalistas viriam de pronto uma metáfora em matar a mãe e deixar os filhos. Eu sou psicanalista mas não quero saber disso, pois não é sobre isso. Mas o que isso tem a ver com o luto?
Essa especialista, que é uma psicanalista, há.. por isso que fui nela! É uma psicanalista nova, pra mim, em todos os sentidos. Nunca havia tido uma sessão em que o analista não arredasse o pé do meu sintoma e não me deixasse vaguear um pouco demais..Ela não me deixa gozar, é uma chatice sem tamanho, parece que não quer saber das minhas escapadas.
Ela não quer saber das minhas formigas, ela quer saber do por quê eu não matei as benditas ainda. E eu quero falar das formigas, “olha como elas andam juntinhas por aí, o que será que estão fazendo?” “pra onde vão?” “Será que vão entrar na minha máquina de lavar e estragar?”. Ela escuta: “eu não estou matando as formigas que podem causar tanto dano na minha vida”. E pergunta, pergunta, pergunta.. e eu me vejo como meus pacientes e querendo esbravejar: “EU NÃO SEI!”. Analista é uma entidade chata mesmo e a gente prova do próprio veneno.
Ela disse que é preciso passar pelo luto, isso eu já sabia. Mas meu corpo não, meu corpo não quer saber do luto. “Coisa chata essa de ficar triste, me sinto angustiada e sem vontade de viver”, “tanta coisa legal pra fazer”. Porém de uma coisa é certa, da vida só podemos desfrutar perante o vislumbre da morte, só existe vida morrendo. As coisas precisam morrer para que outras possam viver. Mas as coisas morrem um dia de fato? Aquilo que eu perdi naquilo que eu vivi que foi terrível, acaba? Quando o luto acaba? É por que as coisas não são “coisas” que o luto talvez não acabe, essa “coisa” é parte da gente e não adianta negar a “coisa” perdida. Perdida está, mesmo que não se mate as formigas de casa. As pequenas que a gente ignora é que fazem mais estrago. Numa pesquisada esotérica que fiz no google, o resultado: formiga em casa é sinal de tristeza!
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